
A equipe da Hemodinâmica do Hospital de Base do Distrito Federal (HBDF) realizou, no último dia 13 de março, o primeiro implante de marcapasso sem fio na história da rede pública de saúde do DF. A paciente beneficiada foi Terezinha Borges, uma idosa de 84 anos, que já possuía um marcapasso tradicional, mas desenvolveu uma complicação rara: a extrusão do gerador, ou seja, o dispositivo saiu para fora da pele, contaminando todo o sistema.
Terezinha passou quase dois anos com o marcapasso de modelo tradicional antes que ele apresentasse o problema de extrusão. “Estava doendo muito e sangrando, uma situação muito ruim”, comentou. “Depois que implantaram o novo aparelho, tenho me sentido mais disposta, menos cansada”, confessa Terezinha, que agora acha que vai conseguir levar uma vida com mais saúde.

De acordo com o Dr. Raoni Galvão, cardiologista arritmologista do HBDF e atuante na área de estimulação cardíaca artificial, a paciente passou por um processo cuidadoso antes da cirurgia definitiva. “Em primeiro lugar, tivemos que realizar a extração desse marcapasso antigo e manter a paciente com um aparelho provisório no Hospital, além de excluir a possibilidade de infecção na corrente sanguínea”, explicou.
Após garantir que não haveria intercorrências, era o momento de realizar o implante do marcapasso sem fio. O procedimento foi realizado na Hemodinâmica, com uso de anestesia geral e durou cerca de 40 minutos. “Não é uma intervenção que envolve qualquer tipo de corte. É feita uma punção em uma veia da região da virilha, e por dentro dessa veia levamos os catéteres até o coração, onde liberamos o aparelho sob visualização direta”, explicou o cardiologista.
Procedimento inovador e recuperação rápida

O marcapasso sem fio representa um avanço significativo na tecnologia de estimulação cardíaca. O dispositivo é pequeno e dispensa os eletrodos que conectam o gerador ao coração, comuns no outro tipo de aparelho. “Se temos um sistema pequeno que dispensa o uso desses eletrodos e já consegue implantar diretamente dentro do coração, praticamente inviabilizamos qualquer tipo de complicação relacionada a cabo eletrodo ou infecção que vem da pele e que pode ser transmitida até o coração, gerando endocardite”, destacou o médico.
A tecnologia é indicada principalmente para pacientes que já tiveram complicações com marcapassos tradicionais, idosos com a saúde mais fragilizada e pessoas com insuficiência renal crônica, especialmente aquelas que realizam hemodiálise. “Foi um caso muito bem selecionado e uma situação muito pertinente para usarmos essa nova tecnologia”, ressaltou Dr. Raoni.
A paciente teve uma recuperação rápida e sem complicações. “No final da tarde, Terezinha já estava conversando, extubada, no leito de UTI, completamente estável. Três dias depois, foi liberada para ir para casa, sem intercorrências no pós-operatório”, contou o médico.
O Hospital de Base oferece diversos serviços dentro da hemodinâmica. Em 2023 foram realizados 407 procedimentos de cardioestimulação entre implantes e trocas de marcapassos e desfibriladores. Já em 2024, esse número aumentou para 438 procedimentos, uma média mensal de 36,5 procedimentos por mês. “Outros procedimentos incluem cateterismos, angioplastias e embolizações, além dos procedimentos da Radiologia Intervencionista”, explica o cirurgião cardíaco e chefe do ambulatório do HBDF, Dr José Joaquim Vieira Junior.
Ainda de acordo com Joaquim, a hemodinâmica do Hospital de Base é uma das referências no DF e atende pacientes para realização de pareceres, atendimentos ambulatoriais e para procedimentos de emergência. “Tirando os emergenciais, todos os procedimentos são regulados pela fila da Central de Regulação da Secretaria de Saúde”, lembra.
Desafios para a incorporação no SUS

Apesar dos benefícios, o marcapasso sem fio ainda não está disponível no Sistema Único de Saúde (SUS), nem consta no rol de procedimentos da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). O dispositivo utilizado no HBDF foi doado pela única empresa que comercializa esse tipo de aparelho no Brasil.
“É necessário realizar não apenas esse tipo de implante, mas trazer outras tecnologias novas para que os pacientes do SUS consigam utilizá-las. Esse marcapasso não é para todos que precisam de um marcapasso, mas pode beneficiar muitas pessoas, especialmente aqueles com comorbidades ou que já tiveram rejeição de sistemas tradicionais”, enfatizou o Dr. Raoni.
O especialista acredita que, com a incorporação da tecnologia no SUS, muitos pacientes atendidos pelo HBDF poderão se beneficiar nos próximos anos. “Para o perfil de pacientes que o hospital atende, a incorporação dessa tecnologia pode reduzir o tempo de internação e complicações associadas ao marcapasso tradicional”, afirmou.
O Superintendente do Hospital de Base, Dr Guilherme Porfírio, comentou sobre o feito da equipe de profissionais da unidade. “A realização do primeiro implante de marcapasso sem fio na rede pública do Distrito Federal é um marco para a saúde pública. Trata-se de uma tecnologia inovadora, que oferece mais segurança e qualidade de vida ao paciente, com menor risco de complicações. Embora ainda não esteja padronizada pelo SUS, essa conquista reforça o papel do Hospital de Base como referência em alta complexidade e nos motiva a continuar buscando soluções que antecipem o futuro da medicina para a população que mais precisa”, declarou.
A expectativa é que a realização desse primeiro implante na rede pública do DF ajude a impulsionar discussões sobre a ampliação do acesso ao marcapasso sem fio, permitindo que mais pacientes tenham acesso a essa inovação na cardiologia.